Em 30, Júlio Prestes e Costa Rego foram exilados para a França. Encontraram-se, numa tarde de neve, à beira do Sena. Costa Rego inconsolável:
-Olhe, Júlio, eu entendo que você esteja aqui. Afinal, foi o candidato à presidência da Republica, a oposição se rebelou e tomou o poder. Eles não iriam querer deixa-lo lá. Mas eu, pobre jornalista e político de Alagoas, não era ameaça nenhuma. Não me conformo.
-Não se conforma, por que? Todos diziam que você ia ser meu ministro da Justiça. É verdade que eu nunca tinha pensado nisso.
-Ora, Júlio, por que você está dizendo isso, nesta tarde tão fria, tão triste? Não custava nada ser amável agora.
E a neve continuou caindo à beira do Sena e dentro dos dois.
MANGABEIRA
Exilado em 30, o ex-ministro do Exterior Octavio Mangabeira estava na Bélgica, e lá encontrou ex-Chanceler da China, também exilado e vivendo como monge em um mosteiro.
Velhos conhecidos de conferencias internacionais, a conversa espichou. Mangabeira não se conformava com o exílio e estava surpreso com a tranquilidade do chinês:
-O que se deve fazer quando a política vira e a gente perde o poder e o direito de viver na própria terra?
-Rezar.
Quinze anos depois, Mangabeira voltava ao poder. O chinês, nunca mais. Continuou rezando.
GILBERTO AMADO
Gilberto Amado, o escritor magnífico, antes de ir para a ONU era embaixador do Brasil no Chile em 37. Em um jantar, uma mulher chamou o Brasil de “paíszinho”, ele lhe deu um tabefe, teve que voltar logo, escoltado. Perguntaram-lhe por que:
-O país é muito bom. Mas não tem calado para Gilberto Amado.
De punição, Macedo Soares, ministro do Exterior, deixou-o muito tempo sem posto. Ele não se conformava:
-Qualquer dia desses, entro no Itamaraty com uma metralhadora debaixo do braço, vou ao gabinete do ministro e tatatatatá tatatatatá, Macedo para um lado, Soares para o outro.
PRESTES
Siqueira Campos, chefe da conspiração em São Paulo, em 30, chamou Oscar Pedroso Horta, redator do “Estado de S. Paulo”:
-Preciso renovar meus códigos de comunicação com Prestes, que está em Buenos Aires, levar uns mapas para ele organizar os planos do levante e trazer de lá um aparelho de radio mais possante. Mas não esqueça: são mapas de guerra, privativos das Forças Armadas. Você vai cometer um crime de traição à Pátria. Topa?
Pedroso Horta topou. Pegou um avião da Nirba numa praia de Santos, dormiu em Porto Alegre, desceu em Montevidéu e voou para Buenos Aires, com aquele rolo enorme de mapas debaixo do braço. Foi para o hotel, de manhã procuraria Prestes no endereço marcado.
De repente, batem na porta do quarto. Era um homenzinho muito magro, com botinas de elástico:
-Sou o comandante Luis Carlos Prestes. O senhor não é Oscar Pedroso Horta? Trouxe uma encomenda de São Paulo para mim?
-Não o conheço. Vim a negócios, não trouxe nada para ninguém.
O homenzinho foi embora. Pedroso Horta trocou logo de hotel, pegou um táxi e foi ao endereço de Prestes. Bateu na porta. Alguém abriu. Era exatamente o homenzinho muito magro, Prestes.