RIO – A sabedoria política nacional acha que ela só existe em Minas, Bahia, São Paulo, no nordeste e no sul maravilha. No entanto ela está espalhada de norte a sul. Por exemplo: o Pará teve um José Maria Alkmim que durou décadas: João Botelho.
*
João Botelho foi candidato a prefeito de Belém. Passou o dia inteiro anunciando um comício à noite, na praça Brasil. Chegou lá, não havia ninguém. Imaginou um engano, perguntou ao secretario.
- Não houve engano não, deputado, a praça é esta mesma?
Foi ao bar mais perto, pediu dois caixotes de madeira, pôs no
centro da praça, subiu e passou a berrar alucinado:
- Socorro, socooorro, socoooooooorro!
Correu gente de todo lado para ver o que era. Assegurada a plateia,
ele começou o comício:
- Socorro para um candidato…
E fez o comício.
*
Deputado do Rio, passou muito tempo sem ir a Belém. Quando foi,
encontrou na rua o filho de um grande amigo:
- E o velho? Ainda não tive tempo de abraça-lo.
- Papai faleceu, deputado.
Desculpou-se como pôde, a vida absorvente do Congresso, a longa
ausência da terra:
- Aceite minhas condolências, extensivas a todos os seus.
Dias depois, volta a encontrar-se com o rapaz:
- E o velho?
- Eu já disse, deputado. O papai faleceu.
- Ah, foi mesmo. Esta minha cabeça! Mas nunca é demais
renovar a expressão de meu pesar.
E deu-lhe um longo abraço. Semanas depois, novo encontro. Foi começando:
- E o velho?
Mas emendou logo:
- O velho sempre morto, não é? Sempre morto.
*
Secretário de Segurança, recebeu em audiência um capitão do
Exército, fardado:
- Tenha a bondade, major.
- Major, não, doutor Botelho, capitão.
- Mas é major na promoção de minha amizade.
*
Encontra o cabo eleitoral:
- Como vai? E a diletíssima esposa? E as crianças?
- Tudo bem, deputado. A mulher está ótima. Mas, por enquanto,
é um menino só.
- E eu não sei que é um filho só? É um menino, certo, mas que
vale por muitos. Então, como vão os meninos?
*
Já fora da política, no Rio, precisava conseguir uns esclarecimentos no Instituto Félix Pacheco. Ia saindo, o colega da Procuradoria da Caixa Econômica chamou a atenção para o calor desesperado que fazia lá fora:
- Mas você sair daqui desse ar refrigerado e enfrentar o sol da
avenida, a pé, até a rua Venezuela? Por que não telefona?
- Pelo telefone eles não informam.
Ligou, fez voz macia:
- Meu filho, aqui fala Monsenhor Botelho, do Palácio São
Joaquim. O senhor cardeal deseja uma informação.
O funcionário anotou, saiu do telefone alguns instantes e voltou com todos os esclarecimentos.
– Muito obrigado, meu filho. Que Deus abençoe e a mim não desampare. Quando puder venha tomar um café com o velho Monsenhor Botelho.