RIO – Em Paris,1977, ligo para a embaixada do Brasil:
– O embaixador está?
– Sim, o senhor ministro está. Quem deseja falar com ele?
É assim. Não é o embaixador, é o ministro. Não é o homem daqui, do exterior, é o homem daí, unha e carne com o dia-a-dia nacional. O homem integrado numa jogada política, hora a hora, minuto a minuto. O homem do poder, pelo poder, para o poder. E o poder, já ensinou a História, é a crônica do permanente instante.
Como sabia Napoleão, insuperável guru destas plagas. Não sei por que, talvez exatamente por isso, é em Napoleão que penso, às 8 da manhã fria desta disfarçada primavera parisiense, quando entro no número 5 da rua Amiral d´Estaing, residência do embaixador do Brasil da França. No gabinete amplo, de livros até o teto, está ele como um universitário inglês, daqueles dos filmes de antigamente, uma ilha de sabedoria cercada de papéis por todos os lados.
De sabedoria, não sei. Mas certamente de informação. Encontro-o de livro na mão: “The Concept of Equality in the Writings of Rousseau, Benthram and Kant, by Alfred T. Williams, 1976.
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Quem é mesmo este homem discretamente gordo, bem mais magro do que o apelido dos amigos – O Gordo -, que está lendo “O Conceito da Igualdade”, numa fria manhã de Paris, 8 horas de sábado?
Nasceu em São Paulo no dia 1º de maio de 1928. (- “Condenação ao trabalho? – Aparentemente. Mas também a liberação pelo trabalho”). Pais: Antonio e Maria, imigrantes italianos, do lar. Antonio, funcionário da Light. Modesto. Quase salário-mínimo. Nunca bateu o olho no dr. Galloti. Cresceu no bairro do Cambuci, o Brás dois, como qualquer menino pobre, espiando as gulosas vitrines do Natal dos meninos ricos. Com dezesseis anos, ainda no ginásio, primeiro emprego para ajudar o orçamento de casa: contínuo da Gessy, que ainda não era Lever. Entra na Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da Universidade de São Paulo. Aí, disparou. Foi logo trabalhar como escriturário do Departamento de Estradas e Rodagem, encarregado do controle de gastos de gasolina. (Se perder a embaixada e não ganhar o governo de São Paulo.) Passou depois para a Bolsa de Mercadorias e Associação Comercial de São Paulo.
Formação toda europeia. Os americanos ainda não haviam multinacionalizado a universidade brasileira. Os professores mais marcantes eram Mr. Stevenson, inglês, que introduziu no Brasil os métodos quantitativos na economia, a aplicação da matemática na economia, e Luís Freitas Bueno, em torno do qual se formou o primeiro grupo da escola.
– “A vida pública foi uma convocação do presidente Castelo para assumir a Secretaria da Fazenda de São Paulo, quando o Laudo, vice-governador, substituiu o Ademar. O Ministério da Fazenda foi consequência de uma exposição ao presidente Costa e Silva sobre os problemas agrícolas do país. Era a primeira vez que eu o via. Nisso houve uma influência muito grande do Andreazza. Eu tinha continuado secretário da Fazenda do governo do Sodré. Sai de lá para o Ministério. Desde 52 sempre cooperei com o governo, participando da formulação de alguns planejamentos. No governo Carvalho Pinto, participei do Plano de Ação. Fiquei lá de 59 a 63. Antes disso já tinha trabalhado no planejamento da bacia Paraná-Uruguai. Em 64, 65, tinha-se criado o Consplan, com o Roberto Campos. Fui convidado para participar. Junto com o Graciano Sá e com um grupo que estava tentando verificar o que podia acontecer com o país em dez anos, trabalhamos muito na formação de um plano.”
(Revista Status,1977)