RIO – O homem é a palavra. O mais é circunstância. A história é a palavra. O resto é consequência. Por isso a história do homem é a história de sua palavra. É a crônica de sua linguagem. É o cotidiano do possível dizer.

Na Grécia livre de Péricles, o discurso era a palavra. Na Judéia oprimida do Cristo, o discurso era a parábula. Na Idade Média torturada de Galileu, o discurso era o silêncio. O que é a Bíblia senão a fábula do povo judeu tiranizado sob os salgueiros da Babilônia? O que foi a tragédia grega senão a metáfora da liberdade? E as fábulas do escravo Esopo, cordeiro respondendo ao inquérito do lobo? E Bernard Shaw roendo a empáfia do império britânico?

Menino de fazenda, cedo aprendi que quando a estrada não dá caminho, toma-se o atalho. É o jeito de dizer, pela boca dos outros, o tornado indizível. O humor é uma linguagem absolutamente séria, necessária, eterna. Desde o começo dos tempos, sempre foi mais proibido proibir o humor.

Folclore não é história. É a versão popular da história. Folclore político não é história política. As histórias vão mudando na boca do povo como as nuvens mudam na boca do vento. Monteiro Lobato definiu exato: “Folclore são as coisas que o povo sabe por boca, de um contar para o outro”.

Se Maurice Latey diz que “a história é o povo em ação”, está pondo o folclore como categoria científica, crônica da vida comum, poema do dia a dia, o contar para o outro, o cantar dos medievais menestréis.

Quando, em agosto de 1973, no auge do calar a boca nacional, lancei o Folclore Político nº 1 no Clube dos Repórteres Políticos da Guanabara, com a presença de José Américo de Almeida, José Maria Alkmin, Magalhães Pinto e mais de cinquenta colegas de jornalismo político, José Américo com sua competente precisão de linguagem, colocou o livro nos termos preciso: “É folclore. Nenhuma das histórias a meu respeito é inteiramente exata, mas nenhuma é inteiramente inexata, E são todas muito engaçadas”. E Alkmin: “Essas histórias do folclore político a gente nunca sabe quais são as verdadeiras e quais as inventadas. O povo vai contando e elas vão se modificando, se reproduzindo. Como os cogumelos. Quem é que sabe quem é a mãe do cogumelo?” A tiragem de 100 mil exemplares, em três edições, provou inteiramente sua atualidade.

As histórias não são minhas. Recolhi-as, uma a uma, aqui e ali, no Pais inteiro, exatamente como me foram contadas. Mas tenho consciência de seu valor político, antropológico, sociológico. Elas provam duas verdades verdadeiras, nestes dias de tanta verdade mentirosa.

1 – A liderança histórica e permanente do homem político na vida nacional. No distrito, na cidade, no Estado, no País, sempre foi o político quem deu a palavra final. Daí a história das nações ser, antes de tudo, a história de seus políticos, dos que carregam nas mãos o sentimento do povo, sua representação e liderança.

2 – O compromisso de diálogo e da liberdade no dia a dia da vida política brasileira. Os grandes personagens de nosso folclore político, e portanto de nossa política, são em geral homens bons, às vezes primários, mas compreensivos, liberais, humanistas, sábios. A crônica do ódio, da violência, da truculência, da tirania que tanto se vê hoje por ai, não faz parte deste livro. Ela é um grito, um gemido, um ai de exceção. Não está no cotidiano de nosso viver.

Constatar isso já é ver abertas as janelas do amanhã.

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