RIO – A vida pública deve ser exercida com vocação na convicção de ser um servidor do seu povo. Denegrir esse princípio no exercício da função publica é trair o sentido maior da representação popular. Arrivistas despreparados no exercício da administração pública, em todos os níveis, vêm invadindo a vida política brasileira com audácia incomum.
O professor Jairo Nicolau, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é autor de um livro essencial para entender a representação do Brasil político contemporâneo. “Representantes de Quem? Os (des)caminhos do seu voto da urna à Câmara dos Deputados”. Retrata o desvirtuamento dos homens públicos, na sua maioria, investidos de mandatos e a desarrumação geral do sistema eleitoral brasileiro.
O cientista político lamenta que os grupos qualificados fugiram da politica e isso fez mal ao País. “Comparando o nível atual com o de décadas atrás, caímos em um abismo gigantesco. É que a política, de certa maneira, deixou de ser um atrativo para segmentos da classe intelectual. Quantos escritores, professores universitários temos hoje no Congresso? Um Florestan Fernandes, um FHC, formuladores, ideólogos no sentido próprio da palavra? E lideranças empresariais e artísticas? Quantos advogados constitucionalistas? Muito menos! Creio que por causa de tantos escândalos, da decepção com a politica em si, essas elites se afastaram do núcleo político. E isso faz muito mal ao País”.
O voto obrigatório hoje no mundo existe em poucos países. Em apenas 31 deles, destacadamente na América Latina com 13, inclusive o Brasil. O total de países no mundo, de acordo com a ONU, são 236. Desses (desenvolvidos e em vias de desenvolvimento), no expressivo número de 205, o voto é facultativo. Voto é direito da cidadania, não é obrigação. No Brasil, a legislação eleitoral é punitiva e impositiva na obrigatoriedade do ato de votar. Ajudando a alimentar narrativa falsificada da realidade, ignorando e iludindo a oposição publica. Os candidatos vendem soluções fáceis e vazias de conteúdo. Desprezam a construção de relações de confiança entre candidato e eleitor. O que leva ao comprometimento de uma sociedade civilizada e democrática.
Na revista Veja (28/03/2018), o articulista e analista J.R.Guzzo, destaca: “Não existe democracia quando os governos são escolhidos por um eleitorado que tem um dos piores níveis de educação do mundo. Em grande parte incapaz de entender direito o que lê, as operações simples de matemática, ou noções básicas do mundo em que vive. O que pode sair de bom disso aí? O cidadão precisa passar num exame para guiar uma motocicleta. Para eleger o presidente da República, não precisa de nada”.
O resultado é quase sempre escolhas equivocadas com impacto no presente e no futuro do Brasil. Dai brotam governos incompetentes, ineptos e, muitas vezes, trapaceiros que tem, em círculos repetitivos, levado a sociedade ao descredito nas ações e diretrizes do poder publico.
Estamos construindo um modo de vida no qual o princípio de que “todos são iguais perante a lei” é ficção. Na prática, o princípio vale para poucos que tem assegurados os seus privilégios, com a criação de leis e sinecuras do Estado, garantindo a tirania na maioria.